terça-feira, 22 de junho de 2010

Irina Ionesco - Entrevista

O que eu posso dizer é que a fotografia certamente mudou minha maneira de enxergar tudo à minha volta. E lendo esta entrevista com uma profissional veterana e de trabalho muito interessante, eu posso ter certeza de que muita água ainda vai rolar em baixo da ponte do meu conhecimento.

Concordo com diversas coisas que ela fala e acho que, independente de vocês concordarem propriamente ou não, vale a imersão nesse universo tão grandioso do pensamento imagético.
Aproveitem!

Entrevista com a fotógrafa Irina Ionesco, via LookMelissa:

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Eva, retratada pela mãe.

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Polêmica fotógrafa fala sobre a diferença entre erotismo e pornografia


Confira entrevista com a francesa Irina Ionesco

Maria Júlia Lledó
 
Criada na Romênia, a francesa Irina Ionesco conta que começou a desenhar desde que um lápis caiu em suas mãos. Fato tão comum durante a infância, mas que transformou o olhar de menina. A partir daquele momento, “poderia capturar as imagens que me subjugavam”, conta.

A pintura, no entanto, foi apenas um pretexto para que a francesa comunicasse sensações, fantasias e desejos femininos pelas lentes da câmera fotográfica. Hoje, aos 75 anos, Irina é respeitada como a grande dama da fotografia erótica. Alvo de polêmica nos anos 1970, após registrar a filha Eva dos 4 aos 13 anos adornada por flores e em poses de ninfa, Irina depõe contra qualquer vulgarização do erotismo.

Em fotos em preto e branco, o cenário que explora é onírico. Uma ode à feminilidade. Tais atributos também inseriram o seu trabalho no universo da moda. Ela já fotografou para revistas europeias, norte-americanas e japonesas. Provida de um olhar sensual e maduro, Irina desvincula-se de padrões estéticos e não se limita à ditadura da beleza jovem.
 
- A sedução pode ir até os 80 anos – afirma.

Recentemente, assinou o editorial Cirque Sinistre da marca de sapatos Melissa na última edição da revista brasileira Plastic Dreams. Para divulgar a exposição Espelhos de luz e sombra, em cartaz na cidade, a fotógrafa deu a seguinte entrevista por e-mail. Nela, ela fala sobre sua relação com a fotografia, a moda e o erotismo.


Como sua história na fotografia começou?
Fiz teatro e dança, atividades a que me dediquei durante 10 anos, até os 28 anos. Quando fui dançarina, era o alvo dos olhares. Depois que sofri um acidente, que me impediu de continuar dançando, fiquei perdida. Não era mais nada, não via nada. Eu estava morta. Foi assim que comecei a querer desenhar, inscrever imagens e olhar os outros. Pintei por sete anos. Gostava, mas era um trabalho muito solitário e eu estava acostumada com a presença do público. A pintura não tolera a presença do outro, mesmo quando se trabalha com modelos. O modelo fica absolutamente mudo e parado durante horas. A comunicação não é possível, pois se se entabula uma conversa, a obra do pintor se esfacela. Essa espécie de religiosidade silenciosa me pesava muito, pois sou uma pessoa espontânea e, de certa forma, exibicionista. A fotografia foi consequência da pintura, que me ensinou tudo: a enquadrar, a olhar.

Por que o erotismo presente em suas fotografias causa tanta celeuma?
O erotismo é a vida. É, por exemplo, uma rosa que se abre. Não é a pornografia. Quando paramos de desejar, não há mais vida. Ele é algo de velado em relação à pornografia. Esta depende de uma exibição, que é muito mais consumível de maneira carnal do que simplesmente mostrada. A pornografia pode ser, por exemplo, uma penetração, coisas vulgares, filmes pornôs. Ela é uma forma de excesso, mas que não tem nada a ver com o erotismo. Um olhar pode ser erótico, bem como uma pontinha da orelha, uma voz, uma certa maneira de pousar a mão sobre a coxa, um perfume, um jeito de mexer o corpo ou fazer surgir o tornozelo. O erotismo é algo misterioso, sem relação com uma cópula, que pode ser vista numa tela de cinema. O amor é algo vivido, pessoal e secreto. Ninguém pode ter acesso à intimidade de uma pessoa. A pornografia faz parte de um comércio execrável. A diferença entre a pornografia e o erotismo é muito sutil, da ordem do inefável.

Por que as fotos da sua filha Eva ainda provocam tanta polêmica, mesmo diante da sua concepção do erotismo na fotografia?
Eva e eu sempre tivemos uma grande cumplicidade. Eu fotografava as mulheres e ela estava lá, por perto. Eva sempre teve o teatro no sangue e acabamos fazendo essas fotos juntas. Nunca expus nenhuma ideia à minha filha. Todas as crianças brincam dessa maneira. Qualquer menininha traz dentro de si toda a feminilidade do mundo. Não se deve pensar que as crianças são bobas ou que vivem num universo em que não percebem nada. Não é possível refazer o trabalho que fiz com Eva com outras garotinhas da mesma idade. Eva é minha filha e tirei essas fotos por amor. Não é por ser minha filha, mas Eva é um personagem que me subjugou. Além de fotógrafa, Eva é atriz, faz teatro, dirige vídeos. Somos uma família de artistas. Atualmente, ela está dirigindo um filme que conta a nossa história. Isabelle Huppert interpreta o meu papel. Continuo a tirar fotos dela, mas são de outro tipo. As fotos que fiz com Eva já entraram na história da arte e estão para além de qualquer juízo crítico.


Qual a relação do seu trabalho com a moda?
Os editoriais de moda que fiz vieram a partir da descoberta do meu trabalho, em que uso elementos da alta-costura, próprios do universo onírico. Fiz o meu primeiro ensaio para a revista francesa Rebel e, a partir daí, vieram os convites de publicações inglesas. As revistas norte-americanas vieram em seguida e acabaram atraindo as japonesas. Fiz para o Japão um lindo trabalho sobre Alice no país das maravilhas. É um ensaio que implica a travessia do espelho, distante da realidade banal e das fotografias convencionais e estereotipadas de moda. Foi a partir de um trabalho meu, publicado na revista inglesa Dazed and Confused, que um representante da Melissa brasileira veio me procurar para participar da revista que eles editam. Agora, começo a preparar um editorial de moda para o Lanvin.


A indústria da moda impõe padrões de beleza. Isso limita o seu trabalho?
Procuro sempre fazer algo atemporal. Para mim, a fotografia é poesia, uma escrita teatral em que eu fixo todas as minhas fantasias de forma obsessiva. Cada sessão de fotos me permite integrar a mulher em um universo de sonho, no qual ela mesma é mítica, múltipla. Adoro a feminilidade exacerbada, todos os elementos que fazem com que a mulher exista. Se a seda, o batom, as peles, o salto alto foram criados, não foi visando os homens. Toda a indústria de sedução baseia-se na mulher. Infelizmente, tudo é concebido para a mulher que tem até 30 anos. É por isso que fotografo mulheres que passaram dos 30 e são extremamente sedutoras. Não há limite para a sedução, que pode ir até os 80 anos. Tudo depende de quem se é, e do que se quer ser.


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