sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

24 de fevereiro de 2023

ALERTA DE GATILHO: menções a violência sexual/pedofilia (sem descrição do evento) e as consequências emocionais de curto e longo prazo geradas por isso. 


Eu vivi muitos ciclos até hoje. Consegui, geralmente depois de ter atravessado eles, enxergar os contornos que os formavam. Mas recentemente um evento trouxe a tona um assunto que eu evitei minha vida inteira. Um acontecimento que moldou muito da minha maneira de me portar no mundo e que eu tranquei a sete chaves dentro de mim esperando que sumisse: a violência sexual que sofri aos 6 anos de idade.

Já citei esse acontecimento aqui antes, mas nunca antes eu parei pra olhar com profundidade pra situação porque me causa uma sensação paralisante, desesperadora, uma sensação de pequenez e vulnerabilidade (no sentido de insegurança, estar em risco) que me congela, me silencia, me dói de maneira debilitante.

Tentei conversar sobre isso em terapia ao longo do meu crescimento com algumas profissionais, mas sem muito sucesso. 

Quando aconteceu a violência eu me senti muito mal. Sentia que aquilo não era algo normal de acontecer, mas não sabia como nomear e sentia que já dava trabalho demais pras pessoas à minha volta, então também não contei pra minha mãe nem pra outras pessoas da família. 

Anos depois, numa aula de biologia sobre educação sexual (ISTs, métodos contraceptivos, informações preventivas sobre violência sexual) eu descobri um nome pro que eu tinha sofrido. Foi um estalo e um susto ao mesmo tempo. De repente eu pensei "FOI ISSO!! foi isso que aconteceu comigo!!". E assim, uns 7 ou 8 anos depois de ter acontecido, eu sentei com minha mãe pra contar a respeito.

Ela procurou me acolher da maneira que conseguiu, mas hoje eu vejo que as ferramentas emocionais que ela tinha disponíveis na época mais me silenciaram do que apoiaram de fato. E eu não guardo mágoa disso, eu sinto e sei que ela fez o que melhor que pôde com o que ela tinha.

Conversando com minha terapeuta recentemente eu percebi que nunca recebi o colo que eu precisava em relação a esse assunto na época. Meu pai até hoje não sabe. Minha mãe já não está mais aqui pra eu chorar nos braços dela como fiz tantas vezes por outros motivos.  

É uma dor tão estranha, porque apesar de ter pessoas que se ofereceram pra me ouvir a esse respeito recentemente, é difícil falar. É algo que eu gostaria de arrancar de dentro de mim pra sempre, mas eu sei que não é assim que funciona. Até hoje eu não me sinto no direito/possibilidade de pedir os colos que eu mais gostaria de receber. 

Esse evento da minha infância me traumatizou criando um sistema de defesa em que eu suprimi a minha sensualidade da forma mais intensa que eu pude ao longo da minha vida. É uma sensação de que se mesmo sem fazer nada eu já sofri aquilo, imagine se eu "desse motivo" existindo com minha sensualidade de alguma forma.

Então eu vivi em alerta a vida toda, perdendo minha espontaneidade, na tentativa de me proteger de outras situações de violência sexual. Na real, toda mulher numa sociedade patriarcal como a nossa vive em estado de alerta, vive em risco iminente de violência pelo simples fato de ser quem é. Mas cada pessoa reage de uma forma particular a essas coisas, em diferentes níveis e maneiras.

Eu cresci sentindo nojo de mim, evitando me olhar no espelho. Porque por mais que o que eu via era significativamente próximo do padrão estético da sociedade em que eu me encontrava, o que eu enxergava era apenas a sensação de violação, como se aquele corpo tivesse sido responsável pelo que aconteceu.

Afinal, culpabilizar a vítima e tirar a responsabilidade dos agressores é também um movimento padrão na nossa sociedade. Daí, mesmo que pessoas não tivessem me falado que a culpa do meu evento era minha (porque simplesmente as pessoas não ficaram sabendo disso na época), eu cresci ouvindo sobre outros casos de violência sexual coisas como "mas ela não devia estar na rua essa hora", "com uma roupa/atitude dessa, o que ela esperava que acontecesse?", e tantas outras possibilidades de frases revitimizantes super comuns, infelizmente. E os agressores tendo sua culpa e reponsabilidade retiradas dos ombros, na esmagadora maioria das vezes seguindo suas vidas impunemente.

Tenho feito um mergulho profundo, reavaliado minha vida desde o começo buscando enxergar em quais aspectos esse evento influenciou minhas escolhas, atitudes, maneiras de me ver no mundo e, infelizmente, cada vez enxergo mais a influência. 

Enxergar em si é bom, o triste é ver o quanto isso me moldou na vida. O quanto isso ainda me amarra tão fortemente até hoje. Porque eu não quero mais me colocar diante do mundo da mesma forma, mas tem sido um processo extremamente doloroso e debilitante olhar pra essas coisas e buscar mudar minha estrutura. É como arrancar um exoesqueleto que já estava totalmente fundado em mim. Me rasga, me despedaça, pra que depois eu tenha a possibilidade de caminhar com minhas próprias pernas da maneira que eu achar melhor.

Ao mesmo tempo que eu quero desesperadamente me desfazer dessas amarras, não me sentir mais refém desse gatilho, é também desesperador me deparar com o fato de que eu ainda não sei como fazer diferente. Me ver buscando fazer algo e sendo engolida por um gatilho de novo.

Ano passado voltei a dançar e é uma atividade muito significativa pra mim. 

Desde que retomei, fui sentindo o desejo de me reconectar com minha sensualidade de alguma forma, porque muitas vezes as músicas me traziam o desejo de me mover de uma forma mais sensual. Não era um desejo de poder sensualizar pro meu parceiro, ganhar likes ou algo assim. Era de mim pra mim. Uma urgência de me sentir inteira de novo, retomar essa parte minha que foi sufocada por tanto tempo. 

Na aula de dança fomos incentivadas a começar a treinar dança em estilo livre (freestyle), treinar nossas expressões faciais também (interpretação) e a nos gravar fazendo essas coisas pra começar a nos familiarizar com registros, pra desenvolvermos nossa autoconfiança ao longo do tempo e ser mais confortável nos apresentar no próximo espetáculo. 

Música sempre foi uma parte essencial de mim. Sempre ouço e sinto muito a música. Então decidi seguir a sugestão e gravei uma dança freestyle da música Fever do Enhypen, que eu gosto muito, escuto sempre e me dá mesmo muita vontade de dançar.

Tem mais de duas semanas que gravei e até hoje não consegui assistir o vídeo todo. 

É uma gravação de quase 3 min, mas eu não passo de 20 segundos porque vai me dando um desespero profundo ver. Me sinto ridícula, me sinto exposta, me sinto em situação de risco, como se algo de muito ruim fosse acontecer se eu continuasse "me colocando" no mundo daquela forma. Fico literalmente nauseada tentando assistir. E das vezes que tentei acabei tendo crises de choro em seguida. 

Não dancei de forma super sensual nem nada assim, mas estava um dia muito quente e eu dancei de croped e short, testando movimentos de venho treinando pra melhorar a mobilidade do meu quadril e esse conjunto de coisas já é bem mais do que eu me permiti em muitos anos. 

Essa reação tão avassaladora que eu tenho tido me entristece muito porque eu gostaria de conseguir assistir ao vídeo todo e ver como anda minha postura, minha movimentação, minhas expressões, coisas técnicas que eu poderia melhorar mas sequer consigo descobrir por causa do gatilho. 

Antes de fazer esse registro eu tinha feito alguns planos de estilos de dança/técnica/música que eu queria exercitar gravando assim, mas agora estou sentindo em desencanto com a ideia. Racionalmente quero continuar as gravações e assistir o que já fiz, mas a ferida ainda está aberta de uma forma que não consegui no momento dar continuidade.

Não tenho espelho grande em casa na frente do qual possa treinar e ver como vão esses aspectos e minha aula de dança é só uma vez por semana. Atualmente gravar seria minha melhor possibilidade de ir treinando e avaliando os pontos com potencial de melhora. E eu tô aqui, me sentindo exausta e assustada com a possibilidade.

As vezes eu me pego desejando pensar menos, sentir menos, me importar menos. Tem momentos em que eu desejo ser menos empática, ser menos suscetível ao que está a minha volta. Mas eu reconheço que essas características, junto com meu desejo constante de aprender, de conhecer, de ser uma versão melhor de mim, são coisas muito importantes pra formação de quem eu sou. Eu só preciso aprender a me proteger um pouco melhor, a dosar melhor pra não ser engolida por elas.

Eu decidi dar esse mergulho em mim depois de um acontecimento recente no trabalho que me trouxe um gatilho muito significativo semanas atrás. Eu decidi fazer os processos internos porque eu não quero mais só sobreviver, eu quero viver, eu quero ser livre pra fazer as coisas que me apaixonam em paz, pra ser espontânea. Quero me entregar nas minhas atividades sem ser paralisada pela percepção aterradora de não ser perfeita, de não ser digna de ocupar espaços no mundo.

Até no MUAYTHAI (também comecei ano passado) que era o lugar aonde eu conseguia me desligar de tudo e estar completamente presente por alguns minutos, eu não tenho mais conseguido. Me vejo travando pela percepção de que o progresso que eu tinha feito se perdeu nos dias em que fiquei longe doente. Me sinto tosca por não estar conseguindo fazer coisas que eu já conseguia. Era o meu maior refúgio de espontaneidade e entrega e agora não tenho conseguido mais me desvencilhar da auto cobrança nem lá.

Minha torcida é pra que depois de eu atravessar esse processo eu consiga trazer mais leveza pra minha vida. Eu consiga me expressar mais livremente na dança - porque pra mim ela nunca foi simplesmente diversão. Assim como o desenho e o canto, ela sempre foi um meio de comunicação/processamento do meu mundo interno. Uma ferramenta muito importante, indissociável de mim, que ficou esquecida por um tempo.

É disso que eu tô falando, sabe? Eu gostaria de conseguir simplesmente curtir as coisas de forma despretensiosa, mas não é assim que eu funciono. Eu não consigo, por exemplo, não prestar atenção na letra das músicas. Assistir um clipe sem pensar nas implicações sociais e culturais que as escolhas de figurino, cenário, coreografia, etc., trazem. Eu sei que esse olhar questionador é importante pra gente tentar mudar alguma coisa nesse mundo, mas é exaustivo também.

Não sei bem como terminar esse texto. Mas sinto que ele está chegando ao fim.

As reflexões vão continuar. Os processos estão seguindo seus próprios passos. Sinto que tenho muitas lágrimas pra fluírem ainda sobre tudo isso. Faz parte. Vamos caminhando, um dia de cada vez.

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terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

One Day at a Time - Ateez (Cantante - covers meus)

"Um dia de cada vez" é meu lema na vida há muitos anos.

Em um período em que eu estava em crise depressiva meu pai me ensinou esse pensamento. Ele o conheceu no AA (Alcóolicos Anônimos) e se tornou uma fonte de conforto que decidiu compartilhar comigo. 

Esse lema foi crucial em vários momentos da minha vida, me incentivando a continuar aqui, a tentar um pouco mais, mais um dia, só mais um dia...
Recentemente conheci o grupo de k-pop Ateez e me apaixonei pelas performances/vozes sinceras e cheias de energia, pelas letras das músicas que compartilham reflexões importantes pra mim ou contam estórias que me interessam, etc.

Quando conheci a música One Day at a Time ("Um dia de cada vez" em tradução direta), não tive como não me apaixonar imediatamente! Por ser toda em inglês eu tive como fazer um cover dela sem tanta dificuldade com a pronúncia \o/ Só sofrendo pra ter ar o suficiente e cobrir 8 vozes complementares só com a minha rsrs

Enfim, o resultado tá aí abaixo. Dessa vez fiz um cover sing along (cantando junto com a música original ao invés de só minha voz) pelo app StarMaker. O início da música é muito grave pra mim, mas eu fiz o melhor que consegui. Longe de perfeito, mas muito sincero: 



Aqui é possível ver eles cantando a música e eu sugiro fortemente buscar a letra/tradução, porque ela deixa o coração muito quentinho <3 
 


Eu comecei a estudar Inglês por conta própria na pré-adolescência porque queria entender/cantar as músicas que eu gostava e conhecer melhor as pessoas criadoras delas. E agora me vejo fazendo um movimento em direção a aprender coreano pelo mesmo motivo. Vamos ver como as coisas caminham.

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Lean Beef Patty - gratitude sketches

Conheci o trabalho online da Patty no ano passado e a abordagem empática, inclusiva e gentil dela sobre as atividades físicas me fez lembrar o quanto eu amava estar em movimento e o quanto eu gostaria de retomar isso. 

Pra quem quiser conhecer, seguem links:
Youtube, TikTok, Instagram dela.

No fim do ano passado decidi retomar uma antiga série de retratos baseados em fotografias chamada "gratitude sketches" justamente fazendo um pra agradecer a ela por todo o incentivo.

Levou bastante tempo pra terminar por minha dificuldade de sentar pra desenhar na correria dos últimos meses, mas agora no início do mês terminei.

Muito difícil registrar o desenho, até agora não consegui uma reprodução realmente fiel, mas fiz o melhor que pude. A última imagem é o print que eu usei como referência. Ficou mais ou menos assim:







 



 

 

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